As aplicações das tecnologias dos lasers agora premiadas passam por ajudar a desvendar os mistérios de vírus e células e pelo uso em cirurgias oftalmológicas.
O Prémio Nobel da Física de 2018 vai para três investigadores sobre os seus trabalhos na física dos lasers (...). Metade do prémio, no valor monetário de nove milhões de coroas suecas, ou 866 mil euros, vai para o norte-americano Arthur Ashkin e a outra metade para o francês Gérard Mourou e a canadiana Donna Strickland.
No anúncio, o comité resumiu que o prémio vai para “as ferramentas feitas de luz” ou, na justificação mais formal, para “invenções revolucionárias no campo da física dos lasers”. (...)
Arthur Ashkin, dos Laboratórios Bell (em Holmdel, nos EUA), desenvolveu uma técnica de laser descrita como “pinças óticas”, que é usada para estudar sistemas biológicos e para controlar minúsculos organismos vivos. Já Gérard Mourou, da Escola Politécnica (em Palaiseau, França) e da Universidade do Michigan (EUA), e Donna Strickland, da Universidade de Waterloo (Canadá), desenvolveram novas formas de produzir impulsos de laser de alta intensidade e muito curtos a partir de uma técnica que inventaram chamada chirped pulse amplification (CPA), que em português poderá designar-se como “amplificação de impulsos com dispersão temporal”, ou ainda “amplificação de impulsos com trinado”.
Os avanços dos três laureados ocorreram nos anos 80. Nascido em 1922 em Nova Iorque, Arthur Ashkin inventou as tais pinças óticas, utilizando luz laser para movimentar pequenas partículas para o centro do feixe de luz e mantê-las aí, explica-se num comunicado da Real Academia Sueca das Ciências – ou seja, utilizando a pressão de um feixe de luz poderiam empurrar-se objetos microscópicos e aprisioná-los numa certa posição. Conseguia assim tornar realidade o que a ficção científica já tinha inventado há muito, acrescenta o comunicado: fazer mexer objetos físicos usando a luz.
As pinças óticas são capazes de apanhar partículas, átomos, vírus e células vivas. Foi em 1987 que Arthur Ashkin conseguiu um grande avanço científico, ao utilizar as pinças óticas para capturar bactérias vivas sem que elas ficassem danificadas, como explica o comunicado: “Começou imediatamente a estudar sistemas biológicos e as pinças óticas são agora largamente utilizadas para investigar a maquinaria da vida.” Pela invenção das “pinças óticas e a sua aplicação aos sistemas biológicos”, como justifica o comité do Nobel, metade do prémio vai para Arthur Ashkin.
Quanto a Gérard Mourou e Donna Strickland, trabalharam juntos, tendo lançado as bases para o desenvolvimento dos lasers de menor duração e mais intensos alguma vez criados pela humanidade. Na verdade, Mourou (nascido em 1944 em Albertville) foi o orientador da tese de doutoramento de Donna Strickland (nascida em 1959 em Guelph), como ela destacou na conversa telefónica durante a cerimónia de anúncio do Nobel deste ano. “Gérard foi o meu mentor. Ele fez tantas descobertas anteriores. É fantástico.”
O artigo científico considerado revolucionário de Donna Strickland foi publicado em 1985, vindo a ser o cerne da sua tese de doutoramento. Publicado na revista Optics Communications, Gérard Mourou era o outro autor, ambos então na Universidade de Rochester, nos Estados Unidos. Incrível ainda nesta história científica é que esse artigo científico foi o primeiro que Donna Strickland publicou na vida e que, ao fim de 33 anos, viria a dar-lhe visibilidade mediática mundial com a atribuição do Nobel.
A técnica de CPA consiste na criação de impulsos de laser de duração ultracurta e grande intensidade sem que o material ótico sofra danos. Primeiro, usa-se um impulso de laser de curta duração, depois aumenta-se a sua duração, a seguir esse impulso alargado temporalmente é amplificado e, por fim, é comprimido para uma duração próxima da original. “Se um impulso é comprimido temporalmente e fica com menor duração, então mais luz é empacotada no mesmo espaço minúsculo – a intensidade do impulso aumenta de forma drástica”, nota o comunicado.
A técnica CPA é hoje utilizada, por exemplo, de forma rotineira por todo o mundo em cirurgias oftalmológicas que utilizam lasers.
Na conversa telefónica de Donna Strickland para a Real Academia Sueca das Ciências, onde os jornalistas presentes puderam fazer-lhe algumas perguntas, (...).”
E quando recebeu o tradicional telefonema da academia sueca, pouco tempo antes do anúncio ao mundo do nome dos três premiados, para lhe comunicar a grande novidade? “Pensei que era uma loucura e se seria real”, respondeu. “Primeiro, pensei que podia ser uma partida, mas como era o dia do Nobel seria uma partida cruel”, diria depois a Adam Smith, que também quis saber se ela estaria preparada para ser muito requisitada agora com o prémio Nobel. “Tenho muito medo disso. Há pouco tempo estava a falar com uma pessoa que ganhou um Nobel e ela disse-me que tinha viajado 100 mil quilómetros num ano. Tenho medo disso. Ainda por cima, os cientistas nem sequer podem viajar em primeira classe”, ironizou.
A Göran K. Hansson, secretário-geral da academia sueca, os jornalistas perguntaram ainda se tinha uma ideia da percentagem de mulheres nomeadas para o Nobel da Física (os nomes dos nomeados não são revelados). “Não tenho as estatísticas. Mas é uma percentagem pequena. Por isso, tomámos medidas para encorajar mais nomeações. Não queremos deixar de fora ninguém.” Olga Botner, do comité do Nobel da Física e especialista na área de investigação agora distinguida, acrescentou que o número de nomeadas tem aumentado e que isso reflete o trabalho que iniciaram há cerca de 30 anos.
(...). Aqueles que o receberam fizeram grandes contribuições para a humanidade.” (...).”
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